09.09.2010
Jornal "Valor Econômico"
Opinião
Cristina no país das maravilhas
Roberto Luis Troster
O título lembra obra da literatura "nonsense" misturando populismo, corrupção, inépcia e repressão. É uma história com repetições de uma trama com os mesmos elementos num lugar fantástico, revelando uma lógica do absurdo, característica dos sonhos e dos pesadelos.
A personagem principal é Cristina e a narrativa começa em 1973, na celebração do fim da ditadura militar. A volta da democracia expõe a incapacidade dos governantes eleitos em apresentar um projeto de país e fazer acontecer. Em pouco tempo, o quadro econômico se deteriora e os relatos de corrupção aumentaram. A inépcia em administrar o país recebia críticas cada vez mais fortes.
O governo identificou a origem dos problemas nos que reclamavam, e optou por fazer-los calar. Para tanto, foi criada a AAA - Aliança Anticomunista Argentina, apesar da inexpressividade do partido comunista lá. O início do movimento repressivo foi contundente, foram contabilizados 600 "desaparecidos" em menos de três anos, antes do apagar das luzes da presidência de Isabel Perón.
A partir de 1976, a volta do governo militar repetiu os mesmos elementos, numa dimensão que nem o mais criativo dos escritores argentinos conseguiria imaginar. Foram dezenas de milhares de "desaparecidos", a justificativa era uma guerra para defender os princípios "ocidentais" do país.
Os militares no governo mostraram-se incapazes de fazer a economia decolar e foram coniventes com uma corrupção sem paralelos na história. A falta de apoio popular já era notória por ocasião da Copa do Mundo de futebol em 1978. Mais medidas populistas foram adotadas, todas com fôlego curto, a última e a mais desesperada foi o ataque às ilhas Malvinas, um desastre militar e político.
É sempre a mesma trama. Em vez de um projeto de país, os governantes têm um projeto de poder. A falta de capacidade de fazer acontecer é compensada com medidas populistas. Em vez de entender que a origem dos problemas está dentro da Casa Rosada, colocam a culpa em quem aponta as distorções. É a lógica de quebrar o espelho quando a imagem está ruim.
Cristina agora é a protagonista. Foi eleita presidente, sucedendo o marido. Na gestão de seu patrimônio pessoal tem um desempenho comparável ao dos melhores empresários do mundo; junto com o esposo, tem um patrimônio pessoal de US$ 14 milhões, que cresce a taxas elevadas. Entretanto, na condução do país, ela insiste em repetir o padrão de governos anteriores.
Não há uma agenda para o futuro, apenas medidas imediatistas, como a estatização da previdência privada para fazer caixa para o tesouro, controlar o câmbio, tabelar preços e distorcer a realidade.
Um exemplo é o tratamento dado à inflação: quando começou a subir, em vez de atacar as causas, interveio no Indec, o órgão que calcula a evolução dos preços e do PIB (o equivalente ao IBGE daqui). Abundam denúncias de manipulação dos números. Este ano, a Argentina deve ter uma inflação da ordem de 30% ao ano, uma das maiores do mundo.
A insistência num populismo anacrônico piora o desempenho econômico com consequências cada vez mais evidentes: gargalos em infraestrutura, nível de investimento baixo, racionamento de energia, risco país alto, uma dinâmica fiscal com uma deterioração crescente e a confiança dos empresários no governo em queda. Na última semana, o presidente da Unión Industrial Argentina comparou o país com Cuba, apesar do exagero, o fato é que o clima é pouco propício para realizar negócios. Ela já amarga derrotas no Congresso e perdeu a maioria do legislativo. A perda de popularidade está colocando em risco seu projeto de poder.
A causa não é da realidade que insiste em conspirar contra a inépcia e sim da imprensa que noticia o que está acontecendo. Nesse caso, a solução é abafar a imprensa, quebrar o espelho. O alvo principal é o jornal "El Clarín", o de maior circulação lá. Uma das ações foi forçar a quebra de um contrato da AFA com o grupo Clarín, para a transmissão dos jogos de futebol, empregando como argumento "o sequestro de gols" fazendo uma analogia com a ditadura militar, mas usando o mesmo esporte para tentar ganhar popularidade.
Outras ações contra o grupo jornalístico incluem uma megablitz da receita federal na empresa, uma lei restringindo a atuação do grupo em outras mídias, o cancelamento da autorização para operar TV a cabo, a anulação da licença para oferecer serviços de internet, piquetes organizados por sindicatos pró-governo impedindo a saída dos caminhões que distribuem os jornais e, nas últimas semanas, uma manobra para expropriar a fábrica de papel de imprensa com argumentos fantasiosos.
É a mesma lógica das tramas anteriores, um espelho que não reflete uma imagem favorável tem que ser destruído. O ponto é que mesmo quebrando todos, o final da história é conhecido: uma crise, seguida de um recomeço, este, quiçá, com um final feliz.
Roberto Luis Troster é economista.
Caderno: Brasil
Mercosul quer dobrar cota para venda de banana à UE
Assis Moreira
O comissário de Comércio da União Europeia (UE), Karel de Gucht, terá na terça-feira, em visita ao Brasil, uma mostra da demanda que o Mercosul fará para fechar um acordo de livre comércio birregional, com o caso da banana. O bloco do Cone Sul planeja duplicar sua demanda de cota livre de tarifa para exportar a fruta, passando de 120 mil toneladas em 2004, quando a negociação foi paralisada, para 250 mil toneladas agora.
"Recebemos a garantia escrita do Itamaraty e do Ministério da Agricultura de que essa será agora a demanda do Mercosul", diz Newton Assunção, diretor da multinacional Del Monte e presidente do grupo setorial de frutas do Ceará.
Nas negociações, a União Europeia tinha proposto cota de apenas 60 mil toneladas para o Mercosul. Depois acenou verbalmente com cota de 90 mil toneladas para fechar o acordo, o que afinal não ocorreu. Agora, produtores dizem que estão pedindo apenas fatia de 5% do que a União Europeia importa, que são 5 milhões de toneladas de banana por ano.
Com a cota livre de tarifa, os produtores brasileiros teriam ganho de 3 por caixa, ou seja, de 39 milhões no total, para 13 milhões de caixas. "Se isso não vier, para compensar o que perdemos com a valorização cambial, teremos um desastre, porque a América Central fez acordo com a União Europeia e terá redução gradual de tarifa para entrar com a banana produzida na região", afirma Assunção.
Somente a Costa Rica, segundo ele, exporta 100 milhões de caixas de banana para a UE. "O que o Mercosul está pedindo é viável, se todos quiserem fechar um acordo", diz.
O comissário europeu estará semana que vem em Brasília mais preparado para evitar casca de banana em seu caminho, do que em acelerar uma negociação que é rejeitada pela França, país que tem "parceria estratégica" com o Brasil.
Jornal "O Estado de S. Paulo"
Notas & Informações
Melhor coordenação na Europa
A crise financeira poderá resultar, afinal, em fortalecimento político e maior coordenação econômica da União Europeia. Ministros de Finanças dos 27 países-membros concordaram em submeter as propostas orçamentárias de seus governos ao controle da Comissão Europeia, o órgão executivo do bloco. O exame deverá ocorrer a partir de 2011 e servirá para reforçar a disciplina fiscal e conter a expansão dos déficits e do endividamento. Hoje o exame é feito depois da aprovação dos projetos pelos Parlamentos nacionais e, na prática, serve para nada ou quase nada. Com o novo sistema, a análise dos projetos de orçamento será realizada antes do envio ao Legislativo.
Os europeus deram um passo importante no caminho da coordenação quando 16 países da União Europeia adotaram a moeda única - o euro - e entregaram a formulação de sua política monetária a um banco central comum. O grupo inclui três das maiores economias do bloco, a Alemanha, a França e a Itália, mas não o Reino Unido.
A experiência foi produtiva em alguns aspectos, mas faltou avançar na coordenação fiscal. Embora houvesse acordos sobre metas fiscais e limites para o endividamento, o controle das finanças públicas foi insuficiente. Já era falho antes da crise e foi simplesmente esquecido quando estourou a bolha de crédito e cada governo tentou enfrentar como pôde a recessão e o risco de quebradeira dos bancos. A gravidade da situação fiscal tornou-se evidente quando a Grécia chegou à beira do calote e foi salva no último instante pela ação conjunta das instituições europeias e do FMI. Nesse episódio ficou também evidente a precária condição das contas públicas da Espanha, de Portugal, da Itália e também da maior economia europeia fora da zona do euro, o Reino Unido.
Durante alguns meses, houve dúvidas sobre a permanência da Grécia na união monetária, embora a hipótese de sua exclusão tenha sido sempre descartada, no discurso oficial, pelas autoridades mais importantes da zona do euro. Mas em alguns países, como na Alemanha e na Holanda, houve considerável pressão interna contra o socorro a países classificados como gastadores e incapazes de administrar suas contas. Por que os "povos do Norte", austeros e produtivos, deveriam sustentar os irresponsáveis "do Sul"? Essa atitude retardou a aprovação política do socorro à Grécia.
Mas o pior momento parece haver passado. Não houve nenhum calote, até agora, e alguns governos - como os da Grécia, da Espanha, de Portugal e do Reino Unido - anunciaram grandes pacotes de correção fiscal e programas de reformas nas áreas trabalhista e previdenciária. Um plano de austeridade foi prometido também na Alemanha, menos por necessidade real, segundo alguns analistas, do que como exemplo para os menos afeitos à disciplina financeira.
A ideia mais construtiva surgiu há poucos meses: os governos dos 27 países deveriam submeter seus projetos de orçamento a um controle prévio. Poderia ser um modo mais eficiente de promover a coordenação fiscal. A proposta, agora aprovada pelos ministros de Finanças, será submetida aos chefes de governo na reunião de cúpula do Conselho Europeu, no fim deste mês. Não parecer haver dúvidas quanto à aprovação. Mas falta acordo, por enquanto, sobre mecanismos de coerção para impor disciplina a governos menos austeros.
Sem um esquema de sanções, a coordenação poderá ser insuficiente. Mas provavelmente será bem mais eficaz do que foi nos últimos anos. A mera discussão das propostas orçamentárias na Comissão Europeia deverá permitir um elevado grau de articulação fiscal. Mesmo sem punições formais, pressões políticas e morais podem ser eficazes, se os controles forem exercidos com rigor.
No Mercosul, a história tem sido muito diferente. Antes de tentar a coordenação fiscal e monetária, os governos deveriam ter cuidado seriamente da integração produtiva e da articulação comercial. A união aduaneira é uma caricatura e cada dificuldade é motivo para recuo na política de integração, não uma oportunidade de avanço.
Jornal "O Globo"
Opinião
Vale tudo contra a imprensa argentina
Mais uma vez a Casa Rosada ignorou a Justiça, desta vez regulamentando dispositivos da Lei dos Meios de Comunicação, que se encontra sub judice. Passa a viger a parte feita sob encomenda para forçar o Grupo Clarín a se desfazer de canais de TV, em nome da democratização da mídia. Com isto, decidiu que começa a contar de hoje o prazo de um ano para o chamado desinvestimento.
Além de nova demonstração de desrespeito às instituições republicanas, o governo argentino insiste em quebrar a espinha dorsal do Grupo Clarín, para deixá-lo dependente de verbas públicas, o que será o fim da sua independência como seria de qualquer outra empresa do ramo, no mundo. Diluir grandes grupos de mídia, dependendo do mercado em que atuam, visa a desestabilizá-los economicamente, reduzir sua escala e torná-los dependentes de verbas oficiais. Tudo com a finalidade de controlá-los. Costuma-se citar regra semelhante que vigora nos Estados Unidos, onde o Federal Communications Commission (FCC), a agência reguladora do setor, limitou a propriedade cruzada (jornal, TV e rádio no mesmo mercado). Sucede que o tamanho do mercado publicitário americano é tal que conseguiu durante muito tempo sustentar a independência de grandes grupos de comunicação.
Mas, mesmo assim, no auge da crise recente dos jornais, o empresário Rupert Murdoch, dono da News Corp., proprietária do Wall Street Journal, entre outros veículos no mundo, chegou a propor, como alternativa, uma flexibilização da regra anticoncentração, que, por sinal, já tinha sido revista: desde 2007, grandes grupos de mídia foram autorizados a operar jornais e emissoras de rádio ou TV nos 20 maiores mercados americanos, sob condições. Ora, não se pode comparar sequer de longe o mercado publicitário argentino nem o brasileiro com o americano.
Não é por acaso que em quase toda grande cidade dos EUA existe apenas um grande e influente jornal. Enfim, todo o discurso contra a concentração da mídia em voga na América Latina visa a desestabilizar os grupos de comunicação que não dependem unicamente de qualquer grande anunciante, tampouco do Estado. Se a Lei dos Meios vier a ser aplicada na íntegra, a imprensa argentina terá de buscar mais da metade de seu faturamento em fontes oficiais. Decreta-se, assim, o fim da liberdade de imprensa no país. É o que o governo Kirchner persegue a todo custo, para não ter quem lhe aponte publicamente os desmandos, mas apenas elogios de veículos domesticados pelas verbas estatais. Dados oficiais divulgados em Buenos Aires mostram que, nos primeiros meses de 2010, empresas de grupos que mantêm uma boa relação com a presidente Cristina Kirchner chegaram a receber 780 vezes mais recursos destinados à publicidade oficial do que veículos críticos do governo. Entre 2008 e 2010, a publicidade oficial caiu 60% no caso do Clarín, e 50% no do La Nación, ambos diários independentes, críticos dos Kirchner. É de se esperar que a Justiça argentina, que recentemente suspendeu a intervenção federal na empresa Papel Prensa, controlada por Clarín e La Nación, atue com firmeza também neste caso. Disso depende, em grande parte, a preservação das instituições democráticas na Argentina
Kirchner atropela a Justiça para prejudicar grupos independentes
Caderno: O Mundo
Cristina aprova polêmicos artigos contra mídia
Janaína Figueiredo
Correspondente
BUENOS AIRES. Em mais um capítulo da disputa do governo da presidente argentina, Cristina Kirchner, com os meios de comunicação privados do país, a Casa Rosada aprovou duas resoluções que estabelecem a entrada em vigor de polêmicos artigos da Lei de Serviços Audiovisuais, aprovada no ano passado pelo Congresso. Uma das resoluções prevê a implementação do artigo 161, que obriga empresas do setor a venderem licenças de rádio e TV num prazo máximo de um ano caso possuam mais de dez concessões (a lei anterior permitia 22), suspenso pela Justiça em processos abertos pelos grupo Clarín e Uno. Segundo explicaram analistas locais, se a divisão de poderes for respeitada, os grupos Clarín e Uno não deveriam ser afetados pela resolução de ontem até que a Justiça se pronuncie de forma definitiva sobre o artigo questionado.
A segunda resolução assinada por Cristina modifica os números concedidos aos canais de TV locais, prejudicando especialmente o Todo Noticias, canal do grupo Clarín, que por ordem do Executivo passa do 11 ao 3.
Já o C5N, um dos mais fiéis aliados do casal que governa a Argentina desde maio de 2003, permanece no canal 5.
— As resoluções representam um novo ataque do governo principalmente ao grupo Clarín — disse o jornalista Adrián Ventura, colunista do "La Nación" e do "Todo Noticias". Para ele, "está claro que o objetivo do governo é vencer esta guerra antes das eleições presidenciais de outubro do ano que vem. — A Justiça deveria se pronunciar rapidamente sobre o artigo 161.
De acordo com versões extraoficiais, a maioria dos membros da Corte Suprema de Justiça, que será a encarregada de tomar uma decisão definitiva sobre o polêmico artigo da lei que o Congresso aprovou em 2009, é contra sua aplicação. No entanto, o clima de medo que se instalou no país desde que o casal Kirchner decidiu liderar uma guerra contra os meios de comunicação teria chegado aos tribunais e seria o principal motivo pelo qual os membros da Corte Suprema ainda não anunciaram sua posição.
Jornal “Folha de São Paulo” Caderno: Mundo Crise reduz fluxo de imigrantes ilegais para EUA Entrada de indocumentados caiu quase dois terços em 2007-2009 em comparação ao período entre 2000-2005 É a primeira inversão no crescimento da população ilegal nos EUA em duas décadas, aponta instituto Pew A crise econômica que estourou nos EUA em 2008 teve como consequência uma redução na entrada de imigrantes ilegais no país. Segundo estudo do Pew Hispanic Center, braço do renomado Pew Research Center, o fluxo anual de indocumentados foi quase dois terços menor de março de 2007 a março de 2009, na comparação com a primeira metade da década. O declínio contribuiu para a queda total da população de ilegais vivendo nos EUA -8% menos em 2009, em relação a 2007. "Essa diminuição representa a primeira inversão significativa no crescimento dessa população nas últimas duas décadas", afirma o estudo, baseado em dados do governo americano. Além da crise, da qual o país ainda não se recuperou,
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