Jornal “Valor Econômico”
Caderno: Agronegócios
Rússia pode melhorar acesso à carne brasileira
Em troca de apoio à entrada do país na OMC, Brasil quer garantir maiores vendas ao mercado russo
Assis Moreira | De Genebra
A Rússia sinalizou que poderá melhorar as condições de entrada das carnes brasileiras em seu mercado, mas só começará a detalhar isso no fim do mês em reunião em Genebra. Em contrapartida, quer ampliar suas exportações de trigo, fertilizantes e outros agroquímicos para o mercado brasileiro.
"O comércio agrícola bilateral será ampliado e vai ganhar mais peso daqui para a frente", avaliou o ministro da Agricultura, Wagner Rossi em nota. Ele chefiou missão oficial na segunda-feira e ontem, em Moscou, para negociar com as autoridades russas a instalação do Comitê Agrícola Brasil-Rússia.
Após 18 anos de negociações, a Rússia quer se tornar membro da Organização Mundial do Comércio (OMC) até o fim do ano. Para isso, precisa fazer concessões a vários países a fim de ter apoio ao seu pleito. O Brasil reclama que os russos privilegiaram produtores de carnes suína e de frango dos EUA e da UE em detrimento do país, e quer mudar essa situação antes de dar seu apoio final a Moscou.
Em encontro com a ministro da Agricultura, Elena Skrinnik, Rossi insistiu que o Brasil não quer ser discriminado. " Temos condições de fornecer as melhores carnes para o mercado russo em condições mais vantajosas, inclusive para os consumidores", disse.
O Valor apurou que Skrinnik disse que o Brasil não tem muito do que reclamar, pois já é o principal fornecedor de carne bovina e este ano sequer preencheu a cota de exportação de carne suína. Dados do Ministério da Agricultura confirmam que o Brasil embarca por ano o equivalente a US$ 1 bilhão de carne bovina para a Rússia.
No caso da carne suína, de fato houve queda nas exportações este ano porque os russos não querem pagar o preço cobrado pelo Brasil. Com o real valorizado, o produto brasileiro perdeu competitividade. Ocorre que mesmo antes a participação da carne suína brasileira na Rússia caiu, de 70,7% em 2005 para 39,6% em 2009, enquanto a fatia dos EUA e da UE pulou de 24,2% para 53,4%, depois que Moscou privilegiou os dois grandes parceiros com cotas de acesso.
Pedro de Camargo Neto, presidente da Associação da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína, que acompanhou a delegação a Moscou, insistiu que a discussão agora é sobre as condições futuras do comércio, a partir do que for acertado na OMC, e não sobre uma situação conjuntural.
No caso do frango, a Rússia admitiu que poderá estabelecer cota sem discriminação geográfica para a importação do produto. Os russos antes davam toda a cota para os produtores dos EUA. Depois brigaram com os americanos e deram uma fatia maior para o Brasil. Só que fizeram as pazes com os EUA. Se a cota for aberta a todos, o Brasil tem condições de competir.
A ministra do Desenvolvimento Econômico da Rússia, Elvira Nabiulina, disse a Rossi que ainda este mês novas regras para os países fornecedores serão definidas. Na verdade, isso depende das negociações em Genebra. O Brasil prefere ser submetido a uma tarifa mais alta do que à cota, enquanto os EUA preferem ter a garantia de cota para seus produtores.
O chefe do Departamento Econômico do Itamaraty, ministro Carlos Marcio Cozendey, insistiu que a barganha com os russos, no âmbito da OMC, precisará "aumentar efetivamente nossas exportações" em relação à situação atual.
Enquanto o Brasil quer vender mais carnes, Moscou quer ampliar as vendas de trigo e fertilizante ao país. Para vender mais trigo, pede para o Brasil baixar a tarifa de importação, algo que parece difícil pelo momento. Este ano, os russos suspenderam as vendas de trigo por conta da quebra da safra, mas a demanda visa o futuro. No caso de fertilizantes, a Rússia já é um dos maiores fornecedores do Brasil e o Ministério da Agricultura brasileiro vê interesse dos dois lados em estimular o comércio direto entre empresas russas e compradores brasileiros.
Agora, Moscou pede também que o Brasil acelere a autorização para seus produtores exportarem outros agroquímicos.
Safra de trigo brasileira pode encalhar mais uma vez
"Não há segregação: o trigo bom para panificação é misturado junto com o ruim. Estamos garimpando a produção do Paraná para comprar o cereal", diz PihDepois de ser exportada como matéria-prima para ração por falta de qualidade na safra passada, a recém-colhida produção de trigo brasileiro corre risco de encalhar novamente neste ano. A previsão de grande excedente exportável na América do Sul tem paralisado os negócios com o cereal nacional e já pressionam os preços para baixo. Apenas 15% da safra de 3,2 milhões de toneladas estimada para o Paraná, maior produtor brasileiro, foram vendidos até agora, quando a média é de 20%. Em anos de safra boa, como em 2008, esse percentual chegou a 33%, segundo a Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar).
Entre as razões para o encalhe está a preocupação com a qualidade da safra paranaense, que não estaria com características que permitem seu uso para fabricação de farinha de panificação. O segmento é responsável por 60% do consumo de farinha no Brasil. Além disso, os vizinhos do Mercosul devem ter excedente exportável bem maior do que no ano passado, o que mantém os moinhos confortáveis para postergar compras.
"Já está mais barato para um moinho de São Paulo trazer trigo do Paraguai, cuja colheita é realizada agora, junto com o Brasil e a qualidade é equivalente, do que comprar no interior do Paraná", diz Élcio Bento, da Safras & Mercado. Ele explica que uma tonelada de trigo paraguaio chega ao moinho em São Paulo a R$ 540. Já o cereal paranaense tem de sair do interior do Paraná a R$ 460 para chegar em São Paulo com o mesmo valor. "No entanto, os produtores lá continuam pedindo preços acima de R$ 480 e, por isso, o mercado está travado", completa o analista.
Outro fator de pressão sobre o trigo nacional é que daqui um mês a produção argentina entrará no mercado, o que eleva a possibilidade de encalhe da safra brasileira.
Segundo estimativa da Safras & Mercado, nesta temporada o excedente exportável de trigo nos países do Mercosul, exceto o Brasil, será de 6,7 milhões de toneladas, número que foi de 3,75 milhões de toneladas no ciclo passado.
Isso porque nesta safra, a 2010/11, a produção na Argentina, Uruguai e Paraguai deve crescer substancialmente para 14,3 milhões de toneladas, ante as 10,8 milhões de toneladas de 2009/10.
Além disso, há reclamações, ainda que pontuais, da qualidade do trigo do Paraná. De acordo com Lawrence Pih, presidente do Moinho Pacífico, um dos maiores da América Latina, o trigo nacional está com bom aspecto, devido ao clima favorável durante a safra. No entanto, o índice de força de glúten - fundamental para farinhas que se destinam à panificação - está abaixo do necessário. "Estamos garimpando trigo com alta força de glúten. A maior dificuldade é que não há segregação do cereal, conforme suas características.
Assim, o bom e o ruim vão para uma vala comum", diz Pih.
Ele estima que grande parte dos moinhos tem estoques de trigo suficientes apenas para até o fim deste mês de outubro. "A saída será continuar garimpando e, complementar o volume com importação do Hemisfério Norte, ainda que esteja mais caro", afirma Pih. A estratégia deve funcionar até meados de novembro quando começa a entrar a safra da Argentina.
Flávio Turra, assessor técnico da Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar), informa que 80% do que foi colhido até o momento está classificado como trigo pão, com nível de força do glúten acima de 180 joules (medida de energia), conforme Instrução Normativa 7, do Ministério da Agricultura.
Mas, o ideal para a indústria, explica um trader que opera com o cereal no Brasil, é que o índice de força do glúten tenha 250 joules, número que está abaixo de 220 no trigo do Paraná. Roland Guth, Conselheiro do sindicato que representa os moinhos do Paraná, diz que não vê problemas de qualidade do trigo do Estado.
Caderno: Agronegócios
Rússia pode melhorar acesso à carne brasileira
Em troca de apoio à entrada do país na OMC, Brasil quer garantir maiores vendas ao mercado russo
Assis Moreira | De Genebra
A Rússia sinalizou que poderá melhorar as condições de entrada das carnes brasileiras em seu mercado, mas só começará a detalhar isso no fim do mês em reunião em Genebra. Em contrapartida, quer ampliar suas exportações de trigo, fertilizantes e outros agroquímicos para o mercado brasileiro.
"O comércio agrícola bilateral será ampliado e vai ganhar mais peso daqui para a frente", avaliou o ministro da Agricultura, Wagner Rossi em nota. Ele chefiou missão oficial na segunda-feira e ontem, em Moscou, para negociar com as autoridades russas a instalação do Comitê Agrícola Brasil-Rússia.
Após 18 anos de negociações, a Rússia quer se tornar membro da Organização Mundial do Comércio (OMC) até o fim do ano. Para isso, precisa fazer concessões a vários países a fim de ter apoio ao seu pleito. O Brasil reclama que os russos privilegiaram produtores de carnes suína e de frango dos EUA e da UE em detrimento do país, e quer mudar essa situação antes de dar seu apoio final a Moscou.
Em encontro com a ministro da Agricultura, Elena Skrinnik, Rossi insistiu que o Brasil não quer ser discriminado. " Temos condições de fornecer as melhores carnes para o mercado russo em condições mais vantajosas, inclusive para os consumidores", disse.
O Valor apurou que Skrinnik disse que o Brasil não tem muito do que reclamar, pois já é o principal fornecedor de carne bovina e este ano sequer preencheu a cota de exportação de carne suína. Dados do Ministério da Agricultura confirmam que o Brasil embarca por ano o equivalente a US$ 1 bilhão de carne bovina para a Rússia.
No caso da carne suína, de fato houve queda nas exportações este ano porque os russos não querem pagar o preço cobrado pelo Brasil. Com o real valorizado, o produto brasileiro perdeu competitividade. Ocorre que mesmo antes a participação da carne suína brasileira na Rússia caiu, de 70,7% em 2005 para 39,6% em 2009, enquanto a fatia dos EUA e da UE pulou de 24,2% para 53,4%, depois que Moscou privilegiou os dois grandes parceiros com cotas de acesso.
Pedro de Camargo Neto, presidente da Associação da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína, que acompanhou a delegação a Moscou, insistiu que a discussão agora é sobre as condições futuras do comércio, a partir do que for acertado na OMC, e não sobre uma situação conjuntural.
No caso do frango, a Rússia admitiu que poderá estabelecer cota sem discriminação geográfica para a importação do produto. Os russos antes davam toda a cota para os produtores dos EUA. Depois brigaram com os americanos e deram uma fatia maior para o Brasil. Só que fizeram as pazes com os EUA. Se a cota for aberta a todos, o Brasil tem condições de competir.
A ministra do Desenvolvimento Econômico da Rússia, Elvira Nabiulina, disse a Rossi que ainda este mês novas regras para os países fornecedores serão definidas. Na verdade, isso depende das negociações em Genebra. O Brasil prefere ser submetido a uma tarifa mais alta do que à cota, enquanto os EUA preferem ter a garantia de cota para seus produtores.
O chefe do Departamento Econômico do Itamaraty, ministro Carlos Marcio Cozendey, insistiu que a barganha com os russos, no âmbito da OMC, precisará "aumentar efetivamente nossas exportações" em relação à situação atual.
Enquanto o Brasil quer vender mais carnes, Moscou quer ampliar as vendas de trigo e fertilizante ao país. Para vender mais trigo, pede para o Brasil baixar a tarifa de importação, algo que parece difícil pelo momento. Este ano, os russos suspenderam as vendas de trigo por conta da quebra da safra, mas a demanda visa o futuro. No caso de fertilizantes, a Rússia já é um dos maiores fornecedores do Brasil e o Ministério da Agricultura brasileiro vê interesse dos dois lados em estimular o comércio direto entre empresas russas e compradores brasileiros.
Agora, Moscou pede também que o Brasil acelere a autorização para seus produtores exportarem outros agroquímicos.
Safra de trigo brasileira pode encalhar mais uma vez
"Não há segregação: o trigo bom para panificação é misturado junto com o ruim. Estamos garimpando a produção do Paraná para comprar o cereal", diz PihDepois de ser exportada como matéria-prima para ração por falta de qualidade na safra passada, a recém-colhida produção de trigo brasileiro corre risco de encalhar novamente neste ano. A previsão de grande excedente exportável na América do Sul tem paralisado os negócios com o cereal nacional e já pressionam os preços para baixo. Apenas 15% da safra de 3,2 milhões de toneladas estimada para o Paraná, maior produtor brasileiro, foram vendidos até agora, quando a média é de 20%. Em anos de safra boa, como em 2008, esse percentual chegou a 33%, segundo a Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar).
Entre as razões para o encalhe está a preocupação com a qualidade da safra paranaense, que não estaria com características que permitem seu uso para fabricação de farinha de panificação. O segmento é responsável por 60% do consumo de farinha no Brasil. Além disso, os vizinhos do Mercosul devem ter excedente exportável bem maior do que no ano passado, o que mantém os moinhos confortáveis para postergar compras.
"Já está mais barato para um moinho de São Paulo trazer trigo do Paraguai, cuja colheita é realizada agora, junto com o Brasil e a qualidade é equivalente, do que comprar no interior do Paraná", diz Élcio Bento, da Safras & Mercado. Ele explica que uma tonelada de trigo paraguaio chega ao moinho em São Paulo a R$ 540. Já o cereal paranaense tem de sair do interior do Paraná a R$ 460 para chegar em São Paulo com o mesmo valor. "No entanto, os produtores lá continuam pedindo preços acima de R$ 480 e, por isso, o mercado está travado", completa o analista.
Outro fator de pressão sobre o trigo nacional é que daqui um mês a produção argentina entrará no mercado, o que eleva a possibilidade de encalhe da safra brasileira.
Segundo estimativa da Safras & Mercado, nesta temporada o excedente exportável de trigo nos países do Mercosul, exceto o Brasil, será de 6,7 milhões de toneladas, número que foi de 3,75 milhões de toneladas no ciclo passado.
Isso porque nesta safra, a 2010/11, a produção na Argentina, Uruguai e Paraguai deve crescer substancialmente para 14,3 milhões de toneladas, ante as 10,8 milhões de toneladas de 2009/10.
Além disso, há reclamações, ainda que pontuais, da qualidade do trigo do Paraná. De acordo com Lawrence Pih, presidente do Moinho Pacífico, um dos maiores da América Latina, o trigo nacional está com bom aspecto, devido ao clima favorável durante a safra. No entanto, o índice de força de glúten - fundamental para farinhas que se destinam à panificação - está abaixo do necessário. "Estamos garimpando trigo com alta força de glúten. A maior dificuldade é que não há segregação do cereal, conforme suas características.
Assim, o bom e o ruim vão para uma vala comum", diz Pih.
Ele estima que grande parte dos moinhos tem estoques de trigo suficientes apenas para até o fim deste mês de outubro. "A saída será continuar garimpando e, complementar o volume com importação do Hemisfério Norte, ainda que esteja mais caro", afirma Pih. A estratégia deve funcionar até meados de novembro quando começa a entrar a safra da Argentina.
Flávio Turra, assessor técnico da Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar), informa que 80% do que foi colhido até o momento está classificado como trigo pão, com nível de força do glúten acima de 180 joules (medida de energia), conforme Instrução Normativa 7, do Ministério da Agricultura.
Mas, o ideal para a indústria, explica um trader que opera com o cereal no Brasil, é que o índice de força do glúten tenha 250 joules, número que está abaixo de 220 no trigo do Paraná. Roland Guth, Conselheiro do sindicato que representa os moinhos do Paraná, diz que não vê problemas de qualidade do trigo do Estado.
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